domingo, 24 de agosto de 2008

"Encalhado no fado estou"


Na trilha do filme "Terra estrangeira" (1995), co-dirigido por Walter Salles e Daniela Thomas, encontra-se uma bela música com o mesmo título do filme.


Em "Terra Estrangeira" vemos a história de Paco (Fernando Alves Pinto) e sua mãe espanhola (Laura Cardoso), que desejam conhecer a terra de seus antepassados, a mítica San Sebastián. Sem dinheiro após o confisco promovido por Collor de Mello, Paco aceita entregar um pacote misterioso - a pedido do também misterioso Igor (Luís Melo)-, em Portugal em troca do custeio da viagem. Após perder o pacote ele encontra-se com a Alex (Fernanda Torres), brasileira que trabalha como garçonete em Portugal e que vive com Miguel (Alexandre Borges), um músico-contrabandista viciado em heroína. Em fuga para a Espanha, Paco, é perseguido por bandidos interessados atrás do pacote, que trazia um violino com diamantes escondidos. (resenha completa).

A trilha sonora do filme foi escrita por José Miguel Wisnik, e a canção do mesmo título podemos ouvi-la no disco dele Rio São Paulo (2002), mas interpretada por Jussara Silveira. Já sei que o film tem uns anitos, e apesar de não ser a melhor obra de Walter Salles, vale a pena vê-lo e procurar esse disco de Wisnik para ouvir tudo, tudo, e essa maravilha de Jussara Silveira a cantar.


TERRA ESTRANGEIRA


Muito além ou aquém da saudade
sou ninguém ou alguém além da dor
que chegou até onde vai o mar e voltou,
encalhado no fado estou.

Viajante adiante da viagem
a levar todo mar e Atlântida,
sou curare de uma tribo sem margem ,
sem mais terra, sem mal a buscar.

Portugal do tamanho de um mundo,
Cabo Verde apontando pra lá ,
há um lugar (onde está?),
há um lugar (sei que há),

um lugar que faltei achar,
há um lugar (há de vir),
só faltou descobrir
um lugar e ainda quero ir.



quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Espanhol ainda é desvalorizado no turismo

Hoje, no Diário de Notícias

A par do Reino Unido, Espanha é já o principal país de origem dos turistas que visitam Portugal. Quanto aos excursionistas, visitantes que não se demoram mais de um dia, o domínio é completo. O DN foi saber se o mercado já se adaptou a esta realidade ou se basta o 'portunhol'

Espanhol ainda é desvalorizado no turismo

São cada vez mais os espanhóis que cruzam a fronteira para fazer turismo em Portugal. A par do Reino Unido, Espanha é já o país com maior número de entradas. Mas enquanto o inglês é considerado língua franca, o espanhol ainda fica muitas vezes atrás do francês e do alemão no ensino, mesmo nos cursos de turismo, e sobretudo nas informações disponibilizadas aos turistas.

Que os espanhóis são fundamentais, ninguém na área tem dúvidas. O secretário de Estado do Turismo, Bernardo Trindade, considera que se trata de "um mercado estratégico prioritário". É o segundo em termos de número de hóspedes, o terceiro a nível de dormidas - de Janeiro a Junho de 2008 registaram-se mais de um milhões de dormidas de espanhóis -, e o primeiro no excursionismo (cerca de 16 milhões de visitas por ano). O secretário de Estado salienta ainda que é um mercado com um elevado potencial de crescimento e com "particular importância na redução da sazonalidade da procura", já que os turistas do resto da Europa concentram-se sobretudo na época estival.

Para Carlos Costa, especialista em turismo da Universidade de Aveiro, o mercado espanhol é "muito, muito importante e não tem sido tratado como deve ser". Se, por um lado, a língua não funciona como barreira porque a proximidade entre o português e o espanhol torna a comunicação oral relativamente fácil, diz, quanto à informação escrita é fundamental disponibilizar material em espanhol. "Eles têm muita dificuldade em entender--nos, por isso, ao nível da informação escrita, é fundamental que seja dada em espanhol", diz.

A Secretaria de Estado diz que tem havido um "cuidado particular na comunicação, através da adaptação dos meios de promoção e no atendimento, quer telefónico, quer escrito, ao turista espanhol, no respectivo idioma", mas em muitos locais, como museus, ainda é difícil encontrar informação em espanhol.

Quanto ao ensino da língua nos cursos de turismo, Carlos Costa afirma que a principal razão para o espanhol não ser valorizado, ficando atrás do inglês e mesmo do francês e do alemão, é a semelhança com o português . "Nunca coloquei o ensino do espanhol como prioridade porque mesmo que os portugueses não saibam falar a língua, conseguem comunicar com os espanhóis". O professor explica que os alunos preferem escolher o francês ou o alemão, porque "sem aprendizagem não entenderiam nada".

Paulo Vaz, director da Escola de Hotelaria e Turismo de Lamego, salienta que a proximidade originou uma certa desvalorização do espanhol. "A ideia de que todos falamos a língua tem prejudicado a procura e consequentemente a oferta nos cursos de turismo", reconhece. No entanto, considera que o "portunhol" não basta, se queremos ter uma oferta de excelência.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

"Botellón" na ilha de Tavira abre polémica

"O presidente da Câmara de Tavira diz que a legislação espanhola empurrou para o Algarve o fenómeno de jovens a beber em grupo na rua. A Região de Turismo considera perigoso acusar especificamente o segundo maior cliente da região.

Vandalismo, desacatos, barulho a altas horas da noite e uma mão-cheia de comas alcoólicos pela manhã são as razões que levaram o presidente da Câmara de Tavira, Macário Correia, a apontar, ontem, o dedo aos milhares de jovens espanhóis que durante os meses de Verão rumam até ao Algarve - com particular incidência na ilha de Tavira - para a prática do "botellón", que consiste em comprar bebidas de alto teor alcoólico em supermercados e cafés e depois consumi-las em grupo e ao ar livre. "Todos as noites há vandalismo na ilha de Tavira", queixou-se, ao JN, Macário Correia

Mas já o presidente da Região de Turismo do Algarve (RTA), António Pina, pede alguma contenção no tipo de acusações aos jovens espanhóis. "Percebo o problema do presidente da Câmara de Tavira, mas nunca faria uma acusação tão direccionada, até porque não será um problema exclusivo de determinada nacionalidade ou etnia". Nem será, também, uma questão que apenas afecte Tavira, acrescentou, dando exemplos de cidades como Portimão e Albufeira, ou mesmo outras ilhas da ria Formosa. Para António Pina, é preciso também "ter algum cuidado com o tipo de acusações que se faz aos turistas que vêm cá gastar dinheiro". A verdade é que os espanhóis são o segundo maior cliente (em dormidas) do Algarve, a seguir aos britânicos. E a promoção turística do Algarve em Espanha é uma aposta declarada: dos 6,8 milhões de euros disponíveis para promover, em 2008, a região pelo mundo, 750 mil euros (11%) estão a ser gastos no país vizinho.

"A verdade não pode significar qualquer penalização e o bom comportamento não escolhe nacionalidades", contrapõe Macário Correia. "Todos nós conhecemos a língua espanhola e todos os dias os serviços de recolha de lixo da Câmara, quando vão limpar a ilha de Tavira, deparam-se com vários jovens espanhóis em coma alcoólico, com o material de apoio à praia partido frequentemente, entre muitas outras situações", enumerou.

Muitos empresários de restauração da ilha de Tavira não concordam com as críticas aos jovens do país vizinho. Um responsável do restaurante "Zé Maria", que recusou identificar-se, explicou ao JN que "só estão a estragar o negócio na ilha, por causa da imposição de fecho à meia-noite, quando antes estávamos abertos até às duas". Diz a mesma fonte que "os espanhóis são os melhores clientes e não levantam qualquer problema".

Na ilha de Tavira, ninguém quis dar a cara por este assunto. Um cliente de um bar optou pelo anonimato para confirmar as queixas de Macário Correia: "A ilha está a bater no fundo por causa deles". "Os espanhóis que cá vêm nem podem ser chamados turistas. São antes uns invasores, pois trazem tudo com eles, não gastam dinheiro, fazem lixo e tristes figuras, e aproveitam para vender bebidas alcoólicas durante a noite", justifica.

Macário Correia atribui a causa desta vaga de espanhóis adeptos do "botellón" ao endurecimento da lei espanhola contra este fenómeno. Em 2006, foi aprovada a "Ley Antibotellón" na Andaluzia, que proíbe o uso de muitos locais para "botellón". O impacto em Espanha é tal que, em 2004, cerca de 70 mil jovens reuniram-se em Sevilha para um "macrobotellón". Já em Madrid, no ano passado, o bairro de Malasaña esteve dois dias em pé de guerra entre adeptos do "botellón" e a polícia, do que resultaram dezenas de feridos".

In Jornal de Notícias On-line

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Palavras do último livro de Mia Couto


Aos 10 anos todos nos dizem que somos espertos mas que nos faltam ideias próprias.

Aos 20 anos dizem que somos muito espertos mas que não venhamos com ideias.

Aos 30 anos pensamos que mais ninguém tem ideias.

Aos 40 achamos que as ideias dos outros são todas nossas.

Aos 50 anos pensamos com suficiente sabedoria para já não ter ideias.

Aos 60 anos ainda temos ideias mas esquecemos do que estávamos a pensar.

Aos 70 anos só pensar já nos faz dormir.

Aos 80 anos só pensamos quando dormimos.


(Bartolomeu Sozinho, personagem de Venenos de Deus, Remédios do Diabo, de Mia Couto)