terça-feira, 29 de setembro de 2015

Tu e eu (Luís Fernando Veríssimo)

Caricatura do autor feita por Gilmar Fraga


Poesia com humor pela mão de Luís Fernando Veríssimo (Porto Alegre, 1936)


Tu e eu

Somos diferentes, tu e eu.
Tens forma e graça
e a sabedoria de só saber crescer
até dar pé.
Eu não sei onde quero chegar
e só sirvo para uma coisa
- que não sei qual é!
És de outra pipa
e eu de um cripto.
Tu, lipa
Eu, calipto.

Gostas de um som tempestade
roque lenha
muito heavy
Prefiro o barroco italiano
e dos alemães
o mais leve.
És vidrada no Lobo
eu sou mais albônico.
Tu, fão.
Eu, fônico.

És suculenta
e selvagem
como uma fruta do trópico
Eu já sequei
e me resignei
como um socialista utópico.
Tu não tens nada de mim
eu não tenho nada teu.
Tu, piniquim.
Eu, ropeu.

Gostas daquelas festas
que começam mal e terminam pior.
Gosto de graves rituais
em que sou pertinente
e, ao mesmo tempo, o prior.
Tu és um corpo e eu um vulto,
és uma miss, eu um místico.
Tu, multo.
Eu, carístico.

És colorida,
um pouco aérea,
e só pensas em ti.
Sou meio cinzento,
algo rasteiro,
e só penso em Pi.
Somos cada um de um pano
uma sã e o outro insano.
Tu, cano.
Eu, clidiano.

Dizes na cara
o que te vem a cabeça
com coragem e ânimo.
Hesito entre duas palavras,
escolho uma terceira
e no fim digo o sinônimo.
Tu não temes o engano
enquanto eu cismo.
Tu, tano.
Eu, femismo.





sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Morreu o editor Vítor Silva Tvares



Morreu Vitor Silva Tavares, um editor radical

Kathleen Gomes e Lucinda Canelas
21/09/2015 - 13:27


Vitor Silva Tavares, fundador da &etc, era um dos mais originais editores portugueses. Morreu aos 78 anos.

Vitor Silva Tavares, 78 anos, morreu nesta segunda-feira de manhã no Hospital de Santa Maria, em Lisboa, onde tinha sido internado uma semana antes devido a uma infecção cardíaca. A família pretende fazer uma cerimónia privada e prefere não divulgar publicamente informações sobre a mesma.

Os livros ficam, o editor desaparece. Era fácil ficar horas a ouvir Vitor Silva Tavares porque já ninguém fala como ele, um português de língua afiada e refinada, elegante e pé-descalço (ele diria: “do melhor Gil Vicente”), algo que partilhava com o amigo João César Monteiro, tanto quanto a magreza e o espírito libertário. Em 2014, quando o PÚBLICO falou com ele a propósito da edição da obra escrita de César Monteiro, Vitor Silva Tavares confessou que a morte do cineasta, em 2003, deixara um vazio que não tinha sido preenchido. Silva Tavares referia-se a um vazio pessoal, naturalmente, mas também estava implícito um vazio colectivo. O mesmo acontece agora, com a morte de Silva Tavares, um dos mais originais e radicais editores portugueses. É toda uma geração, de resistência cultural e política, que tem os dias contados.

“Perdemos o último dos resistentes, o pai de gerações e gerações de poetas. Há muita gente que lhe vai sentir a falta. Mesmo muita”, diz Paulo da Costa Domingos, poeta e editor da Frenesi, que se cruzou com Vitor Silva Tavares no início da década de 1970, quando o editor o publicou pela primeira vez, ainda na revista &etc que viria a converter-se na lendária editora com o mesmo nome.

Em 1974, ainda antes do 25 de Abril, Vitor Silva Tavares criou a &etc, uma pequena editora independente que se distingue, até hoje, pelo formato quadrado dos seus livros, pelo seu catálogo de autores e títulos raros e marginais e por se manter praticamente inalterável ao longo de mais de 40 anos de existência, apesar das transformações do negócio editorial. Sempre recusou a ideia de publicar livros para fazer lucro. Entre os autores publicados pela &etc contam-se Herberto Helder (Cobra, 1977), Alberto Pimenta, João César Monteiro, Antonin Artaud, Adília Lopes, Henri Michaux, Sade, Robert Walser, entre muitos outros.

(...)

A notícia completa, com links e tudo, no diário Público.



Vítor Silva Tavares na Wikipédia


segunda-feira, 7 de setembro de 2015

"Deve-se ler pouco e reler muito"



"Deve-se ler pouco e reler muito. Há uns poucos livros totais, três ou quatro, que nos salvam ou que nos perdem. É preciso relê-los, sempre e sempre, com obtusa pertinácia. E, no entanto, o leitor se desgasta, se esvai, em milhares de livros mais áridos do que três desertos." 

 Nelson Rodrigues


Nelson Rodrigues (Recife, 1912 — Rio de Janeiro, 1980)