terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

Crónica de uma viagem a Salamanca


Salamanca, dia 24 de Janeiro. Encontro marcado para o início do Congresso Internacional às 17.00h no edifício da Universidade Antiga. Numa tarde bem fria, representantes de todas as universidades espanholas e de quase todas as portuguesas se cumprimentavam alegremente junto a outros vindos da França, de Salzburgo, da Bretanha ou de Massachusetts. A conferência inaugural, um poeta espanhol para mim desconhecido, Antonio Colinas, deu início com uma brilhante leitura taoísta da obra de Fernando Pessoa, no heterônimo de Caeiro. A seguir, várias digressões e aproximações sobre o iberismo. Nos dias 25 e 26 muitas e variadas apresentações sobre literatura e língua a decorrerem entre as salas Unamuno e Salinas de maneira paralela. Entretanto, lá fora, a neve caía e os conferencistas apregoavam frio nas salas nobres do prédio onde o encontro decorria. Os almoços e jantares, pagos pela organização, eram o alvo ideal para o convívio onde todos pareciam bem dispostos e descontraídos por estarem num marco ímpar e por poderem partilhar experiências profissionais, recordações de tempos idos ou, inclusivamente, amizade pessoal. O escritor João de Mello falava, com o mais educado dos sorrisos, com uns e outros, depois de ter assistido a uma crítica do seu Mar de Madrid; uma experiência, quanto menos, pouco frequente. Nos momentos vagos, os congressistas visitavam a Casa Lis ou as torres medievais das catedrais com a grande possibilidade de ver como o eminente professor Eduardo Lourenço, com já muitos anos, galgueava as escadas como se de um rapazote se tratasse. Ele era quem ia fazer o encerramento com uma lição sobre Unamuno e Schopenhauer. Mais tarde, numa livraria, estaria comigo a debater e a falar sobre Domingos Monteiro, autor sobre o que eu falara no dia anterior, para confessar que era desconhecido para ele ao tempo que se apercebia que andava com os óculos de outrem que, depois, viria trocar no jantar. O congresso terminou e todos voltaram não para casa mas para as diversas livrarias da cidade. Mais um momento de conversa entre aqueles que por lá andávamos à procura daquele grande livro escondido numa das estantes de livraria dessa grandiosa cidade.

O próximo encontro marcado será com as próprias actas que, em breve, estarão prontas.

Os organizadores deste organizadíssimo congresso, com o catedrático Ángel Marcos de Dios à cabeça, quiseram deixar como espírito do congresso aquela conhecida frase que Unamuno escrevera a Teixeira de Pascoaes “Es una obra de amor y de cultura hacer que Portugal y España se conozcan mutuamente. Porque el conocimiento es amarse. El conocimiento engendra amor y el amor conocimiento”. Acho que conseguiram bem o intuito!

3 comentários:

Anónimo disse...

Mª Antonia, bem-hajas por esta interessante crónica. O pormenor dos óculos é delicioso...
José Ignacio

Luis Leal disse...

De facto, o detalhe dos óculos é delicioso, mas fiquei muito interessado por todo o conteúdo, do qual destaco o ponto de vista Taoísta da heteronímia de Pessoa e a frase, que não conhecia, de Unamuno. Muito obrigada MªAntónia!

Anónimo disse...

A parte humana, além do conhecimento académico, dalguns dos congressistas foi o que tornou o encontro tão "mágico". Eduardo Lourenço, é de facto, uma pessoa entranhável. Admitiu ainda ter perdido os últimos óculos havia um mês em Berlim.

As actas, que terei em breve, estão à vossa inteira disponibilidade. Algumas digressões foram muito interessantes, não apenas pela leitura taoísta de Caeiro mas também pela aproximação hermética ou simbólica doutros autores; interessantíssimo para mim por ser o tema da minha tese.

Obrigado pelo vosso interesse!