Fotografia de Paulo Pimenta (Público)
O grande silêncio
This is the way the world ends
Not with a bang but a whimper.
TS Eliot
Estive em ambas as manifestações “inorgânicas” que se realizaram a 15 de Setembro e 2 de Março, embora um pouco menos tempo nesta última, limitando-me, por falta de disponibilidade para mais, a descer a avenida, não chegando ao Terreiro do Paço para cantar o tema que serviu de mote à brilhante campanha de marketing da organização.
E sim, a deste ultimo Sábado teve menos gente, o que é natural tendo em conta que não havia um foco específico a combater, como a TSU tão desastradamente comunicada por Passos Coelho em Setembro. E se calhar o tempo estava mais frio. Ou o percurso não era tão aliciante. Ou o metro estava cheio. Ou qualquer outra coisa.
De qualquer maneira, acho que isso talvez seja até um ponto a favor. Tendo em conta que os objectivos desta manifestação eram muito mais difusos (“que se lixe a Troika” continua a ser um slogan tonto), esteve muita gente, muita gente mesmo. E encher uma avenida com um protesto difuso, sem ser num dos dias simbólicos, sem organização profissional tipo CGTP e, mais importante, sem frota de autocarros, é a meu ver impressionante.
Podem ter aparecido menos que nem Setembro. Mas apareceram muitos.
Mas não foram os números, nem os motivos, que mais me impressionaram nesta manifestação. Esta manifestação impressionou-me sobretudo pelo que estava ausente em relação à outra. E o que estava ausente pode ser definido num conceito simples: alegria.
Salve algum, fraco, esforço por parte de alguns activistas, não havia grande palavras de ordem, nem cânticos, nem barulho de panelas, nem slogans memoráveis. Nada. O que me deu por vezes a impressão de estar não numa manifestação, mas num cortejo fúnebre. Houve realmente alturas em que o som que mais se destacava era o do helicóptero. Tudo o resto, tirando o burburinho de fundo, era um impressionante silêncio. Ou, usando um velho cliché que aqui se aplica perfeitamente, um ensurdecedor silêncio.
E no entanto, tendo pouco para dizer ou berrar, milhares apareceram. Como explicar isto?
Há tristeza nas pessoas? Há, com certeza. Desespero? Também. Mas a ideia com que fico é que há sobretudo uma grande falta de fé no futuro, uma falta de respostas para aquilo que as preocupa. Sabem que não querem isto, mas lutam pelo quê, exactamente? Qual é a alternativa? “Que se lixe a Troika”? Onde é que está a esperança que elas merecem?
Lutar contra isto? Sim, claro, foi por isso que apareceram. Mas lutar pelo quê, exactamente? O lado negativo está lá. E o positivo, está onde?
A manifestação de 15 de Setembro foi um aviso ao governo que não valia tudo, que estava a ir longe demais. Na de 2 de Março vi algo diferente. O protesto das pessoas foi dirigido ao governo. Mas o silêncio, creio eu, foi dirigido à oposição. Uns já sabemos que não ouvem. Os outros fariam bem em ter as orelhas no ar.
Lido em Aspirina B (Não mata mas alivia)
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