segunda-feira, 26 de setembro de 2011

"O dia em que nasci meu pai cantava" (Fernando Assis Pacheco)


O primeiro verso deste belo soneto de Fernando Assis Pacheco faz-nos recordar o camoniano "O dia em que nasci morra e pereça", mas é bem diferente. Que grande melancolia!


O dia em que nasci meu pai cantava
versos que inventam os pastores do monte
com palavras de lã fiada fina
cordeiro lírio neve tojo fonte

esta é uma velha história de família
para dizer como ele e eu chegámos
à raiz mais profunda do afecto
da qual nunca jamais nos separámos

nem Deus feito menino teve um pai
que o abraçasse e lhe cantasse assim
desde a primeira hora até ao fim

fui vê-lo ao hospital quando morria
olhos parados num sorriso leve
tojo cordeiro lírio fonte neve

Lisboa, 28-XII-93

 Do seu livro Respiração Assistida, publicado pela Assírio & Alvim, 2003.


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