segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Lobo Antunes, prémio José Donoso

O Prémio José Donoso é um dos mais prestigiados no panorama literário Ibero-Americano, atribuído pela Universidade de Talca, do Chile. A cerimónia de entrega decorreu na sexta-feira 22 de Fevereiro no Instituto Cervantes, em Lisboa, pelas 18h00.

O Prémio José Donoso é outorgado anualmente, desde 2001, à obra de um destacado escritor ibero-americano, de acordo com um júri internacional, constituído por cinco personalidades distintas do mundo literário e académico ibero-americano.

António Lobo Antunes é o primeiro escritor ibérico a receber este Prémio, que lhe foi atribuído em 2006, mas que só agora lhe será entregue.

O júri elogiou a grande variedade de temas, linguagens e estruturas na obra do consagrado escritor, bem como o amor ao seu país de origem e o talento para captar “o papel das culturas periféricas no mundo”.

Coordenado por Javier Pinedo (Universidade de Talca, Chile) fizeram ainda parte do júri Alfonso García Morales (Universidade de Sevilha, Espanha), Thomas Bremer (Universdade de Halle, Alemanha), Francisco Javier Lasarte (Universidade Simón Bolívar, Venezuela), Guilhermo Maraica (Universidade Mayor de San Andrés, Bolívia) e Jaime Concha (Universidade de San Diego, EUA).

Nas edições anteriores, o Prémio José Donoso foi entregue a José Emilio Pacheco (mexicano, 2001), Beatriz Sarlo (argentina, 2002), Isabel Allende (chilena, 2003), António Cisneros (peruano, 2004), Ricardo Piglia (argentino, 2005) e Miguel Barnet (cubano, 2007).



António Lobo Antunes congratulou-se com o facto de ser o primeiro escritor europeu a receber o Prémio José Donoso, um dos mais prestigiados do panorama literário Ibero-Americano, atribuído pela Universidade de Talca, no Chile.

«Para mim, um prémio com o nome de um escritor latino-americano - que tão importantes foram para os escritores da minha geração e tão importantes continuam a ser para todos os escritores - é uma honra», disse o romancista, na cerimónia de entrega do galardão que o distinguiu em 2006, realizada no Instituto Cervantes, em Lisboa".

Composto por uma medalha, um diploma e um cheque de 20 mil dólares, o prémio José Donoso foi entregue ao fim da tarde a Lobo Antunes pelo reitor da Universidade de Talca, Juan Antonio Rock, numa sessão que contou igualmente com a participação do presidente do júri, Javier Pinedo, da mesma universidade, e de António Vieira Monteiro, do Banco Santander.

Às vezes - observou o escritor - «digo a mim mesmo que um prémio nada tem que ver com a literatura, no sentido em que não a torna nem melhor, nem pior do que era, o que não é literalmente verdade».

«Recebi muitos prémios - por vezes, penso que sou um cavalo, que ganha prémios - mas poucos me deram tanto prazer como este (...) porque me é dado por irmãos meus, por gente que sente da mesma maneira, que fala da mesma maneira e que é muito mais parecida connosco do que pensamos«, explicou.

Apesar de se considerar honrado por ser o primeiro escritor europeu a receber este galardão, António Lobo Antunes afirmou, no entanto, que não gosta muito da palavra »europeu«: »Porque não me sinto tão europeu assim«, comentou.

«Por exemplo: a Suécia, a Noruega e outros - o que é que tenho em comum com essas pessoas? Tenho muito mais em comum com a gente da Argentina, ou da Colômbia, ou do México», defendeu.

Segundo o romancista, os portugueses têm uma «vocação atlântica» e «um espírito universalista».

Para o ilustrar, citou, em seguida, um escritor português do século XVIII, Matias Aires.

«Escreveu uma frase muito simples que continua ainda a surpreender-me: 'Porque loucos não os há senão em língua portuguesa' e isto tocou-me sempre muito e fez-me pensar muitas vezes, porque o que eu tento fazer e o que nós, portugueses, tentamos fazer é continuar nas caravelas, continuar a navegar«, disse.

Lobo Antunes referiu que os mapas portugueses antigos, dos navegadores, »desenhavam a linha da costa e como não conheciam nada para o interior, escreviam 'aqui há leões' e, à medida que iam avançando terra adentro, o 'aqui há leões' ia-se afastando da linha da costa«.

«Eu penso - frisou - que o trabalho do escritor e o trabalho que eu quero para as pessoas do meu país, para o meu povo - porque tenho cada vez mais um imenso orgulho em ser português - é que os leões, o medo do desconhecido e o desconhecimento sejam cada vez mais ténues, cada vez mais imprecisos».

É isso que o autor acha que «tentamos com a escrita: mostrar os outros tal como são e mostrar-nos a nós mesmos como somos».

«As páginas de um bom livro são espelhos: cada um se olha a si mesmo e à sua pobre convicção«, observou.

Para terminar, António Lobo Antunes declarou que escreve para cumprir o que dizia Filipe II: »Façamos qualquer coisa que faça o mundo dizer de nós que fomos loucos«.

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