segunda-feira, 9 de abril de 2007

Erro histórico (Tordesilhas...? Alcañices!)

Erro histórico. 'O Tratado de Tordesilhas é de 1494 e não delimitou nenhuma fronteira'


Na Pública do passado 1 de Abril, foi publicada esta carta de um leitor de Estremoz, Carlos Luna, que julgo pode ser interessante para os leitores deste blogue:


«Diz-se que, nos tempos que correm, abundam os disparates no domínio da Cultura. Haverá um certo exagero, mas causa espanto a notícia que circulou em vários órgãos de comunicação (digitais e em papel), segundo a qual responsáveis de Portugal e Espanha se iriam reunir em Badajoz, a 23 e 24 de Março, para pedir à UNESCO que declare a Raia central luso-­espanhola Paisagem Cultural da Humanidade. São dados alguns exemplos: "a paisagem cultural, o urbanismo e a arquitectura de Olivença e o património cultural de Badajoz e Elvas".

A afirmação mais surpreendente consiste em dizer-se que "é a raia mais antiga, consolidada na Europa desde o Tratado de Tordesilhas, de 1297" e nela se sobrepõem estratos de civilizações de diferentes épocas. (...) a Raia Central Ibérica é uma "franja elástica", que precisa de ser inventariada, catalogada, conhecida, planificada e gerida". Pasmemos: o Tratado de Tordesilhas é de 1494, e não delimitou nenhuma fronteira luso-castelhana/espanhola na Península, mas sim os limites mundiais da expansão dos Estados Ibéricos. Isso foi feito pelo Tratado de Alcañices, esse sim de 1297.

Como foi possível um erro destes ter surgido? Como foi possível ter sido reproduzido por vários órgãos de comunicação? Mas há mais: não se duvida das boas intenções de quem quer levar adiante este projecto de classificação da Raia. Será óptimo para as populações da Raia. Mas ... cuidado! Deve-se ter o cuidado de ler, por exemplo, o "Dicionário Jurídico da Administração Pública" (edição em vigor): "(...) Existem, por conseguinte, três troços da fronteira terrestre luso-espanhola a considerar: o primeiro, que vai do Rio Minho à confluência do Caia com o Guadiana, definido pelo Tratado de 1864; o segundo, que vai do Rio Cuncos até à Foz do Guadiana, definido pelo convénio de 1926; e o terceiro, constituído pela parte da fronteira que vai da confluência do Caia com o Guadiana até ao rio Cuncos, que se acha por definir por acordo com Espanha em virtude da questão de Olivença.;(...) A razão desta delimitação proveio do facto do troço de fronteira ao sul do Caia até ao Rio Cuncos, correspondendo à região de Olivença, nunca ter sido reconhecida por Portugal que, desde 1815, contestou a posse de Olivença pela Espanha. (...)"

Também a edição, já deste ano (2007) da Constituição Portuguesa comentada por Vital Moreira e Gomes Canotilho chama a atenção de o Artigo 5º da mesma estar elaborado de forma a "deixar em aberto a questão de Olivença". E, claro, convém não esquecer o problema da posse das águas do Alqueva, em que a Questão de Olivença desempenha um papel de relevo. Espera-se que, neste projecto a enviar para a UNESCO, pelo menos os responsáveis portugueses acautelem estes aspectos. Ou, então, a Espanha, graças a uma simples assinatura num documento aparentemente inócuo, conseguirá o reconhecimento de algo que Madrid procura em vão há duzentos anos: o da posse legal da Região de Olivença».


1 comentário:

Anónimo disse...

Carlos Luna é o máximo activista na "questão de Olivença" e, é claro, não vai deixar despercebido um erro desta magnitude. Mas não esqueçamos que o motivo principal desta chamada de atenção aos meios vem muito por trás do erro das datas!
M.A.